Tive que dividir um único alojamento com um outro colega e não tinha outro jeito, além do alojamento ele ainda fez a gentileza de me emprestar a sua própria roupa de cama. Revezamos em turnos madrugada a dentro. Enquanto eu dormia ele ficava atento no escritório e vice-versa.
Antes que o movimento feminista xiita me use como ponte para ideologias, explico que foi uma situação de emergência. Quero ser honesta e dizer que não é normal isso acontecer na minha polícia. Pelo contrário, o pessoal aqui costuma, na medida do possível ser sensível às questões femininas, inclusive no que tange à maternidade. Essa situação ocorreu fora da minha base, onde, inclusive a chefe do serviço é uma delegada, que não deixaria, propositadamente, uma situação dessas ocorrer sob seu comando. Não sou obrigada a aceitar esse tipo de situação, mas também não sou leviana. Claro que eu poderia simplesmente telefonar pra ela e dizer, "Chefe, não tem condições de dormir aqui, então acione o sobreaviso". Contudo, é esse o tipo de atitude que angaria a antipatia dos colegas do sexo masculino, muitas vezes. E 99,99% dos chefes operacionais são homens. Posso estar errada, mas nesse caso específico, sou adepta da política de que a gente pode ceder um pouco aqui pra ganhar mais lá na frente.
Pra encerrar essas explicações chatas porém necessárias, cabe ainda ressaltar que no local onde estou lotada, onde trabalho normalmente, existe uma suíte relativamente confortável só pra mim, porque sou a mulherzinha do grupo, enquanto todos os outros policiais, mais administrativos e outros dividem as instalações reservadas para os homens.
Voltando ao pernoite, se serve de consolo, o cansaço é um opióide útil nessas horas, e me fez esquecer rápido das preocupações, inclusive com a de higiene do lençol e da minha própria roupa. Só tirei o calçado pra dormir, o resto era a roupa com a qual passei o dia. A-pa-guei. Tivemos que deixar a porta do quarto destrancada porque não tinha chave e tive que entrar lá quando ele estava dormindo pra usar o banheiro sem fazer barulhinho. Mas o mais constrangedor, mesmo, foi a piada que ouvimos do atendente da companhia aérea que trabalhava próximo, e que veio falar com a gente no dia seguinte, enquanto tomávamos café numa lanchonete ali perto: "Parece que a noitada foi boa, hein, pessoal?". Lembrei-me de ter imaginado a fala do meu pai sabendo de uma coisa dessas "Mas minha filha o que as pessoas vão pensar". Respirei fundo e não respondi, apenas fiz aquela cara de poucos amigos, porque se eu der corda esse idiota vai o quê? Perguntar onde é o final da fila ou gritar "Próximo!"? Mas pra minha sorte, o colega soube responder adequadamente, o que me deixou altamente impressionada. E o indivíduo, após recuperar o fôlego, pediu desculpas pela falta de respeito.